27.11.11

Os Discos de Newton (Estudo para fuga em duas cores) de Frank Kupka



Frantisek Kupka (1871 – 1957) foi um pintor checo, licenciado pela Academia de Belas Artes de Praga. Passou pela Akademie der Bildenden Küste, em Viena, e mudou-se para Paris em 1986. Estudou na Académie Julian e na École dês Beaux-Arts, e começa a se dedicar ao estudo da cor por volta de 1906. A produção em óleo sobre tela de “Os discos de Newton” se insere numa fase em que Kupka procura explorar o uso de cores, sensação de movimento e a relação entre pintura e música em suas produções.

A obra Os discos de Newton (Estudo para fuga em duas cores) de Frank Kupka se encaixa no Orfismo, um movimento no interior do Cubismo. O termo Orfismo, criado por Guillaume Apollinaire, refere-se ao mito de Orfeu, um poeta e tocador de lira grego que tinha a capacidade de domar feras através de sua música. Essa relação com a música é o ponto de partida desta análise da obra de Frank Kupka.

A referência a Orfeu representa a possibilidade da fusão da música com outras formas de produção artística, sem deixar de considerar o efeito irracional causado por cada uma dessas formas de expressão. Ao passar alguns minutos observando Os Discos de Newton mesmo sem conhecer seu contexto e seu pretexto, percebe-se uma musicalidade expressa na composição de cores em faixas praticamente concêntricas que se interpolam e sobrepõem. Após situar a obra no movimento orfista e conhecer um pouco sobre o autor, pode-se perceber que essa musicalidade não é um mero acaso.

O subtítulo “Estudo para fuga em duas cores” expressa essa forte relação com a produção de fugas, forma de composição polifônica de arranjos musicais muito presente nas composições de Johann Sebastian Bach.  Kupka acreditava que a pintura deveria ser abstrata como a música, e declarava que poderia relacionar visão e audição e, assim, produzir uma fuga em cores, assim como Bach o fazia na música.

O título “Os discos de Newton” se refere às descobertas do físico Isaac Newton no século XVII, que constatava que a luz do sol é composta pelos sete espectros de cores (vermelho, alaranjado, amarelo, verde, ciano, azul e violeta). Newton expressou a mistura dessas cores na forma de um disco de cores que demonstrava que, da combinação de duas diferentes cores, uma terceira era produzida. Da mesma forma, se todas as sete cores forem misturadas opticamente, produz-se branco.  A composição de Kupka parte das descobertas científicas de Newton e mostra a incorporação de anéis de cores vibrantes, de várias faixas do espectro incluindo o branco. A sobreposição e interpenetração dos anéis de cor produzem uma sensação de movimento giratório, ou como propagação de ondas na superfície da água.

A composição das cores e das formas, e sua conseqüente sensação de movimento evidenciam a intenção do autor de se relacionar pintura e música. Assim como Bach compõe diferentes vozes “sobrepostas” em suas Fugas, Kupka têm bastante sucesso em criar composições com efeitos sensoriais quase audíveis.  Deixando de lado uma análise acadêmica da obra, pode-se quase ouvir a pintura, assim como o Prelúdio e Fuga em Ré Maior de Bach pode quase produzir imagens ao ouvida de olhos fechados. Observar a pintura ouvindo o Prelúdio e Fuga em Ré maior produz um efeito quase potencializado da sensação de movimento da pintura e da criação de imagens pela música, como uma fosse feita com base na outra.

Tal comparação com a música também vale para muitas outras composições de artistas denominados orfistas por Apollinaire, assim como para muitas obras de diversos períodos e movimentos artísticos. O estudo de uma obra de arte envolve sua observação, o conhecimento de seu contexto, de seu autor e de várias características. Mas acredito que sua apreciação e entendimento verdadeiro só podem ser completos quando algum sentimento é despertado.


Referências e fontes de pesquisa:
  ”I can find something between sight and hearing and I can produce a fugue in colors such as Bach hás done in music.” Frank Kupka
MEECHAM, Pam; SHELDON, Julie. Modern art: a critical introduction. Visualização disponível em: http://me.lt/10bSi
Prelúdio e Fuga nº 5 em Ré Maior, BWV 850, Johann Sebastian Bach.  http://me.lt/3T7cEi
MEECHAM, Pam; SHELDON, Julie. Modern art: a critical introduction. Visualização disponível em: http://me.lt/10bSi
ASHBERY, Jonh (et al). Dicionário da Pintura Moderna, São Paulo: Hemus, 1981. Disponível em http://me.lt/7ZVUH
DEMPSEY, Amy. Orfismo. In: Estilos, Escolas & Movimentos: Guia Enciclopédico da Arte Moderna. São Paulo: Cosac & Naify, 2003. pp. 99-101. Disponível em: http://me.lt/10bGJ
Site do Philadelphia Museum of Art (recomendo ouvir o audio sobre a obra, com uma fuga de fundo musical):


Análise de Sara Mendes Teixeira para a disciplina de Fundamentos de Teoria da Arquitetura
Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo
Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP

Nenhum comentário:

Postar um comentário